Equipe LACID: Cândido Grinsztejn, Caroline Assis, Guilherme Barreiros, Maria Eduarda Paiva, Maria Elena Rodriguez, Renan Canellas
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O presidente Lula está prestes a iniciar sua visita à China em um contexto internacional conturbado, marcado pela Guerra da Ucrânia, pelas tensões crescentes entre China e Taiwan e pela disputa cada vez mais acirrada entre China e Estados Unidos que aponta para um ponto de inflexão nas relações internacionais. Historicamente, esses momentos, apesar de delicados em termos securitários e comerciais, representam uma janela de oportunidades para o reordenamento do sistema internacional.
Nesse sentido, tal viagem vem sendo apresentada como um marco da retomada de uma política externa brasileira ativa, na qual o Brasil busca reafirmar sua posição como ator relevante no sistema internacional. O objetivo é levar as relações bilaterais com a China ao mais alto nível na política e no comércio e, paralelamente, fortalecer espaços multilaterais como o BRICS.
Assim sendo, esta viagem abre uma série de oportunidades para o Brasil buscar uma cooperação bilateral mais profunda e ampliada, a diversificação da pauta exportadora brasileira, o fomento do comércio e dos investimentos, assim como a discussão de uma agenda de negociação de paz do conflito europeu.
Do ponto de vista comercial, a visita do presidente Lula pode ser um ponto chave para reorientar o padrão de relacionamento comercial entre os dois países, diversificando a pauta de exportações brasileiras (atualmente baseada majoritariamente em soja, minério de ferro e petróleo bruto) para produtos de maior valor agregado e para formular uma estratégia de cooperação bilateral de fomento a industrialização do Brasil, onde a China pode ter uma contribuição relevante. Para isso, o Brasil precisa assumir um plano e uma visão estratégica de longo prazo.
A cooperação na área científica e tecnológica se mostra bastante promissora, por um lado, o país asiático é líder na produção de uma série de tecnologias verdes, que se tornarão cada vez mais estratégicas, como painéis solares, turbinas eólicas e veículos elétricos; e, por outro, a China também se destaca como um dos líderes no desenvolvimento de tecnologias de informação, bem como em áreas tecnológicas disruptivas, como a inteligência artificial.
Nesse sentido, esta parceria pode gerar benefícios para os dois países em termos de investimentos e transferência de tecnologia. Do ponto de vista brasileiro, seria relevante para alcançar um novo patamar de desenvolvimento e para a ampliar o acesso da população aos benefícios da ciência e da tecnologia. O aprofundamento da cooperação bilateral na área tecnológica também está relacionado com meio ambiente, visto que a discussão da renovação do programa de satélites sino-brasileiros, CBERS (China-Brazil Earth Resources Satellite) – que tem como um de seus objetivos a proteção do meio ambiente através do monitoramento dos biomas brasileiros, em especial, da Amazônia- estará na agenda da visita.
No entanto, a pauta climática que tem sido trazida pela agenda brasileira, remonta a continuação das políticas de crédito de carbono que poderão representar a intensificação do paradigma ambiental dos poluidores internacionais. A viagem do Lula, deveria, contudo, ser apresentada como uma mudança de paradigmas internacionais buscando mostrar o Brasil como um líder quanto à proteção do clima e a preservação dos recursos naturais.
A viagem se apresenta também como uma oportunidade para a promoção de investimentos. Contudo, Lula deve encontrar um equilíbrio entre priorizar o comércio e os investimentos chineses, ao mesmo tempo em que deve tomar uma posição firme quando se trata de questões ambientais, tanto na instalação quanto na operação dos mesmos.
Investimentos no setor de infraestrutura – setor no qual várias empresas chinesas têm expertise – poderiam ser particularmente interessantes para reduzir o déficit logístico no Brasil. Ao mesmo tempo, Lula poderia pedir que a China faça mais para reduzir as emissões de gases de efeito estufa juntamente com o monitoramento e fiscalização das empresas estatais chinesas que operam no Brasil para que elas não prejudiquem o meio ambiente, e evitem os impactos nas comunidades e nos territórios.
O agronegócio brasileiro, um dos setores mais estratégicos do comércio bilateral, teve uma programação que começou antes da visita do presidente e contou com uma comitiva robusta que tinha a expectativa de assinar diversos acordos para obter mais acesso ao mercado chinês.
As pautas do agronegócio, no entanto, muitas vezes são contrárias aos avanços de outras iniciativas tidas como prioritárias da viagem, como: o incentivo a uma aliança internacional de combate à fome, a diversificação da pauta de exportação brasileira e a agenda ambiental baseada na busca pelo cumprimento dos compromissos de combate das mudanças climáticas. A viagem de Lula deve representar uma harmonização desses interesses ou haverá apenas a continuação de relações comerciais fundadas na pauta de exportação de commodities.
Dessa forma, a viagem de Lula poderá simbolizar um marco no poder de barganha brasileiro para conquistar um novo patamar no desenvolvimento econômico se o Brasil optar por uma posição equidistante perante os conflitos internacionais. Ou seja, se o Brasil adotar uma postura que não impeça a possibilidade de abrir espaços de cooperação nem com Estados Unidos e aliados Europeus e nem com Rússia e China, ao mesmo tempo em que consiga estabelecer uma pauta de debates com ambos que beneficie o desenvolvimento tecnológico brasileiro. Mas, para isso, é necessário ter uma agenda clara de futuro na qual sejam minimizadas as contradições entre discurso e prática política, ao passo que apresentam essas pautas de desenvolvimento sustentado e sustentável como definidoras de uma agenda de Estado de longo prazo.
*Os pontos de vista, pensamentos e opiniões expressos neste texto pertencem somente aos autores, e não refletem necessariamente o posicionamento da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) ou de seu Instituto de Relações Internacionais (IRI/PUC-Rio)