Autora: Lara Mendes
Supervisão: Maria Elena Rodriguez
A China, como principal parceiro comercial do Brasil gera um grande impacto ao realizar movimentos de aumento ou de diminuição na demanda de produtos brasileiros. Levando isso em conta, o cenário atípico de pandemia em que 2020 se encontra em decorrência do coronavírus, principalmente pelo fato de ter se iniciado na China, levanta a questão da influência que terá para as exportações brasileiras ao gigante asiático. O primeiro trimestre do ano foi imerso nos efeitos da Covid-19 no contexto chinês, cujo primeiro caso foi diagnosticado em novembro de 2019, e no surto de casos ao redor do mundo. Deste modo, dada a importância do agronegócio na pauta exportadora, cabe analisar como essa área se comportou no primeiro trimestre do ano em relação à China, com destaque para os setores de maior projeção: o de complexo soja e o de carnes[1].
No primeiro trimestre do ano, as exportações brasileiras à China aumentaram em 8,8%, apesar do coronavírus[2]. Esse cenário refletiu positivamente no agronegócio, com a carne bovina in natura e a soja em grãos dentre os principais produtos exportados. No caso da carne bovina, em relação à China, houve um aumento de 124,7% no primeiro trimestre de 2020, comparado ao mesmo período de 2019[3]. No entanto, para além do cenário pandêmico atual, é necessário se levar em conta a crise sanitária que continuou afetando o gigante asiático em 2019, com a peste suína africana dizimando rebanhos de porcos, e aumentando fortemente a demanda por carne no país. De igual modo, outro fator que favoreceu o Brasil, foi a habilitação de novos frigoríficos para venda de carne à China. Em setembro de 2019, foram 25, sendo 17 de carne bovina e dois meses depois, mais 13 plantas frigoríficas, sendo 5 produtoras de carne bovina.
A China é o maior importador de soja do mundo. Nos primeiros dois meses de 2020, apesar do país asiático ter aumentado as importações mundiais, em 14,2%, comparado ao ano anterior, diminuiu em 25% das importações brasileiras. No entanto, em relação à 2019, deve-se considerar que o contexto envolvia a guerra comercial entre China e Estados Unidos, o que levou a uma diminuição significativa das compras da soja norte-americana à época, e um consequente aumento na demanda da soja brasileira. Em 2020 o cenário mudou, com a assinatura da primeira fase do acordo comercial entre estes países, que colocaria fim ao conflito de dois anos. Esse acordo conta com mudanças na área da agricultura, incluindo as barreiras comerciais nesse setor, e a promessa da China de compras adicionais de produtos agrícolas norte-americanos, em US$ 32 bilhões[4] em dois anos. O mês de março, por sua vez, também contou com uma queda nas exportações de soja para a China, justificada, em maior parte, pelas condições meteorológicas adversas de chuvas no final de fevereiro, que atrasaram as vendas.
Apesar da área cultivada de soja na China ter aumentado no último ano, ainda não é suficiente para suprir a sua demanda interna, cujo destino é, principalmente, para extração de óleo e farelo para alimentos. Há a necessidade, portanto, de importações para compensar o déficit doméstico. A partir disso, considerando os principais mercados exportadores de soja para a China, deve-se levar em conta também a diferença entre os ciclos de colheita da soja brasileira para a norte-americana. No primeiro semestre do ano, o Brasil colhe sua safra, com fim em julho, possuindo, portanto, vantagem competitiva nessa época. Já os Estados Unidos tiveram o início do seu período de semeadura no fim de abril, e predominam no segundo semestre. Deste modo, apesar de uma competição pelo mercado, há também uma diferença entre os momentos principais de oferta.
A disseminação do vírus e seus efeitos ainda estão em curso, tanto no Brasil, quanto nos Estados Unidos, o que leva ao debate do real impacto da pandemia no setor e nas exportações, com o passar da primeira onda de maior gravidade da doença. Ainda assim, há perspectivas positivas quanto o aumento da produção nos principais países exportadores de soja[5]. A soja brasileira é vista com maior competitividade, tendo em vista o avanço da colheita nesta safra e maior disponibilidade, além dos diferenciais de preço, uma vez que ela é mais barata no Brasil, considerando o câmbio e em comparação com os Estados Unidos, o que representa um atrativo para os chineses. No entanto, medidas em relação à fase 1 do acordo comercial assinado, já podem ser vistas em prática, com a compra de mais de um milhão de toneladas de soja americana em apenas duas semanas, colocando em questão o futuro das vendas da soja brasileira.
O retrocesso econômico do PIB chinês no primeiro trimestre do ano, em 6,8%[6] somado ao agravamento da disseminação do Covid-19 ao redor do mundo, acirrou o impacto ao Brasil em relação às exportações ao seu principal parceiro comercial. Ainda assim, há uma perspectiva de que a recuperação chinesa, prevista para o segundo semestre, seja benéfica ao agronegócio brasileiro, em grande medida, pelo fato do país permanecer demandando alimentos. No que se refere à soja in natura, as previsões são de que a China será o destino de 85% da safra 2019/2020[7], exemplificando a relevância do mercado chinês para o Brasil. Em relação à carne, a pandemia resultou em uma paralisação da autorização de novos frigoríficos brasileiros produtores de carne, para as vendas à China, porém, o aumento do consumo doméstico chinês ainda favorece o setor de carnes. Deste modo, apesar da redução do patamar do crescimento chinês – bem como o do resto do mundo -, e o fato da China ter saído do seu primeiro momento mais crítico da pandemia, ao passo que os demais países entravam nele, o cenário para o resto do ano de exportação do agronegócio permanece positivo.
Referências Bibliográficas:
[1] Dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), Agrostat – Estatísticas de Comércio Exterior do Agronegócio Brasileiro. Disponível em: http://indicadores.agricultura.gov.br/index.htm
[2] Dado do FGV/Icomex. Disponível em: https://portalibre.fgv.br/sites/default/files/2020-04/boletim_de_com_rcio_exterior-_abril_2020_1__0.pdf
[3] Dado da CNA (Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil). Disponível em: https://www.cnabrasil.org.br/noticias/exportacoes-brasileiras-do-agro-se-mantem-estaveis-no-1-trimestre
[4] US$ 12,5 bilhões acima da linha de base correspondente de 2017, de US$ 24 bilhões em 2020 e US$ 15 bilhões acima da linha de base em 2021.
Dado: Economic and Trade Agreement Between the Government of the United States of America and the Government of the People’s Republic of China. Disponível em:
[5] Dado: autoridades do Ministry of Agriculture and Rural Affairs (MARA) of the People’s Republic of China
[6] Dado: Fundo Monetário Internacional (FMI) – World Economic Forum Outlook, April 2020.
Disponível em: https://www.imf.org/en/Publications/WEO/Issues/2020/04/14/weo-april-2020
[7] Dado: Associação dos Produtores de Soja do Brasil. Disponível em: