Participação dos países membros BRICS na cúpula dos Líderes sobre o Clima

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Autora: Rafaela Mello

Coordenação: Maria Elena Rodriguez

A Cúpula de Líderes sobre o Clima organizada pelo Governo de Joe Biden ocorreu no último dia 22 e 23 de abril e contou com a participação de 40 líderes ao redor do mundo. A convocação dessa cúpula tem como objetivo o fomento da coordenação e da cooperação na arena climática entre os principais atores da comunidade internacional, estabelecendo e fortalecendo diversas frentes para enfrentar a mudança climática através da redução de emissões de carbono e por meio do fomento à inovação, à adaptação e à resiliência[1].

Dentre os principais temas abordados durante os dois dias de cúpula, destacam-se: (1) os esforços das maiores economias em reduzir a emissão de carbono para manter o objetivo de limitar o aquecimento global; (2) o estímulo à criação de tecnologias que podem ajudar a reduzir as emissões, criando oportunidades para a indústria do futuro; (3) os benefícios econômicos da ação de enfrentamento à mudança climática, enfatizando a criação de empregos na transição para uma economia de energia limpa; (4) a mobilização do setor público e privado para ajudar países vulneráveis com os impactos climáticos; e (5) o fortalecimento da capacidade de proteger vidas impactadas pela mudança climática, enfrentando os desafios da segurança global gerados por essa condição ambiental[2].

Esse evento representa a iniciativa do Governo Joe Biden de restaurar os esforços multilaterais dos Estados Unidos nas questões ambientais, visando uma maior participação e protagonismo do país no enfrentamento da mudança climática. Dentre os países participantes, todos os cinco países que compõem os BRICS aceitaram o convite e marcaram presença na cúpula, apresentando iniciativas e indicando compromissos.

O discurso do primeiro ministro chinês, Xi Jinping, foi realizado logo após a fala do Secretário Geral da ONU, António Guterres, sendo o primeiro discurso proferido dentre os líderes convidados por Joe Biden. O líder chinês destacou diversos tópicos ao longo de seu discurso, enfatizando a necessidade do compromisso de garantir a harmonia entre os humanos e a natureza através de uma governança sistêmica. Para isso, ele demonstra o compromisso da China com o Desenvolvimento Verde, destacando que a proteção ambiental permite a proteção e o melhoramento da produtividade. Xi Jinping também aponta a necessidade de um compromisso com a abordagem centrada nas pessoas, buscando igualdade e justiça social através da transição verde, uma vez que o meio ambiente promove o bem-estar a todos.

Além disso, o líder chinês também indicou seu compromisso com o multilateralismo, a partir da condução das questões climáticas com base no direito internacional e nos princípios de igualdade e justiça. Dentro desse aspecto, destacou-se o princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas, que traduz o debate de décadas entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento. Nesse sentido, deve-se reconhecer o dever dos países desenvolvidos em aumentar a ambição e ação climática, elaborando esforços concretos para ajudar os países em desenvolvimento a acelerarem o desenvolvimento verde com baixo carbono. A China, portanto, compromete-se a juntar esforços e fortalecer a governança global climática, além de reforçar seu compromisso com as baixas emissões de carbono e a limitação do consumo de carvão mineral como fonte energética até 2025, destacando que o país chegará a um patamar de neutralidade de carbono em um tempo menor que dos países desenvolvidos. Dentre os pontos mencionados por Xi Jinping em seu discurso, tanto a busca por um desenvolvimento verde e mais inclusivo, quanto as ambições chinesas pela diminuição das emissões de carbono, são elementos presentes no 14º Plano Quinquenal, de modo que estas ações já estão inseridas no planejamento chinês para os próximos anos.

O primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, proferiu seu discurso logo após Xi Jinping, agradecendo, no início, a iniciativa do Presidente Biden pelo evento, que serve como um aviso que a mudança climática não desapareceu, sendo uma realidade para milhões de pessoas ao redor do mundo. O líder indiano destacou a necessidade da realização de ações concretas para combater a mudança climática em escopo global. Além disso, Narendra Modi enfatizou o compromisso indiano nesse sentido, a partir da ambição de atingir a meta de 450 gigahertz em energia renovável até 2030. Um elemento interessante de destacar é que dentre os projetos aprovados para a Índia do Novo Banco de Desenvolvimento – banco dos BRICS – dois são direcionados à energia limpa e renovável[3].

O primeiro-ministro indiano também anunciou a iniciativa que está sendo lançada entre Índia e Estados Unidos, chamada “U.S.-India 2030 Climate and Clean Energy Agenda 2030 Partnership”, com o intuito de ajudar a mobilizar investimento e incentivar tecnologias limpas que permitem colaborações neste âmbito. Além disso, também foi enfatizado a importância de incentivar mudanças no estilo de vida visando formas mais sustentáveis, cuja característica será o pilar da estratégia econômica no pós-pandemia.

A fala inicial de Vladimir Putin, Presidente da Rússia, destacou a potencialidade do quadro jurídico para a colaboração internacional no controle e na redução das emissões de gases de efeito estufa, enfatizando o compromisso da Rússia com a maior responsabilidade neste âmbito a partir da implementação dos acordos e protocolos já instituídos. O líder russo também indicou a tarefa de reduzir as emissões até 2050, demonstrando a possibilidade disso através da comparação com os níveis de emissão em 1990, que caíram de 3,1 bilhões de toneladas para 1,6 bilhão de toneladas de gás carbônico. Esta condição foi possível, na opinião de Putin, graças a uma reestruturação fundamental da indústria e da base energética nas últimas décadas.

Nesse sentido, o presidente russo indicou a relevância da captura, armazenamento e remoção de carbono da atmosfera através de inovações e modernizações ambientais e eficiência energética. Além disso, ele também enfatizou a importância das emissões de metano, que poderiam diminuir a temperatura geral até 2050, incentivando assim a colaboração internacional em torno deste elemento e convidando a todos a se unirem no esforço científico colaborativo buscando tecnologias de baixo carbono. Putin também apontou oportunidades e benefícios para empresas estrangeiras investirem em tecnologia limpa, além da necessidade de lutar contra a pobreza e os gaps entre os países, buscando um desenvolvimento verde e sustentável para todos.

O Presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, iniciou seu discurso agradecendo Biden pelo evento e enfatizando a satisfação de ver os Estados Unidos novamente trabalhando junto dos outros países para enfrentar os desafios da mudança climática. Ele também apontou a grande vulnerabilidade de economias em desenvolvimento, principalmente no continente africano, que podem ser afetadas pela mudança climática e revertendo diversos ganhos de desenvolvimento e levando milhões de pessoas à pobreza. Reiterando o princípio citado por Xi Jinping, o líder sul-africano defende a responsabilidade com capacidades respectivas, ou seja, ele destaca a necessidade dos países desenvolvidos arcarem com a responsabilidade de dar suporte às economias em desenvolvimento, uma vez que os países em desenvolvimento contribuíram menos para a emissão global, ao mesmo tempo que são os países que mais sofrem com os efeitos dramáticos da mudança climática.

Outra semelhança com o discurso chinês foi a ênfase dada ao multilateralismo, defendendo a implementação da estrutura da convenção de mudança climática da ONU, além de reforçar os três objetivos do Acordo de Paris, através da mitigação, da adaptação e do financiamento em direção ao enfrentamento da mudança climática. Nesse sentido, o líder sul-africano defendeu que a ajuda financeira neste âmbito deva ser separada dos outros empréstimos existentes, para que o peso da dívida dos países em desenvolvimento não seja agravado. Além disso, assim como a Índia, a África do Sul também destacou a questão da Energia Renovável como uma das metas para 2030, planejando gerar uma capacidade de 17 gigawatts através de energia limpa. Dos 10 projetos de financiamento aprovados para a África do Sul no banco dos BRICS, três são direcionados a este objetivo[4].

O discurso de Jair Bolsonaro, presidente do Brasil, iniciou com uma menção à voz ativa do Brasil na construção da agenda global sobre o meio ambiente, no entanto, pouco foi abordado sobre os desafios atuais do Brasil, tanto em relação às queimadas, quanto em relação à pandemia. Bolsonaro destacou as características naturais e geográficas do Brasil e enfatizou o avanço do país nas áreas de energia limpa e renovável, além de apontar a diminuição das emissões nos últimos 15 anos. Dessa forma, grande parte dos elementos mencionados no discurso são resultados de governos passados.

Além disso, Bolsonaro se posiciona de maneira convergente ao presidente americano no âmbito das ações climáticas, destacando que a neutralidade no Brasil seja alcançada até 2050 e que possui o compromisso de eliminar o desmatamento ilegal até 2030. Ademais, ele destaca o desafio de melhorar a vida dos brasileiros que vivem na Amazônia, buscando melhorar os índices de desenvolvimento humano na região através do aprimoramento da governança da terra e a efetivação da bioeconomia. O presidente brasileiro finalizou sua fala com um convite à comunidade internacional para contribuir de maneira imediata na solução de obstáculos no enfrentamento à mudança climática, manifestando o convite a países, empresas e entidades a apostar em cooperações com o Brasil para que seja possível vencer os desafios[5].

Portanto, é possível perceber que há certas semelhanças nos discursos dos líderes dos BRICS, principalmente em relação à busca pelo multilateralismo e pela necessária contribuição dos países desenvolvidos na ajuda a países em desenvolvimento no enfrentamento à mudança climática. No entanto, a coordenação de políticas e ações que eram presentes em anos anteriores entre os cinco países não é expressiva, além de não ocorrerem menções diretas sobre mecanismos conjuntos dos BRICS no âmbito sustentável, como por exemplo, a atuação do Novo Banco de Desenvolvimento, que tem o principal objetivo de garantir infraestrutura sustentável em seus países-membros.

Referências:

[1] https://www.state.gov/leaders-summit-on-climate/about/

[2] https://www.whitehouse.gov/briefing-room/statements-releases/2021/03/26/president-biden-invites-40-world-leaders-to-leaders-summit-on-climate/

[3] https://www.ndb.int/projects/list-of-all-projects/

[4] https://www.ndb.int/projects/list-of-all-projects/

[5] Os discursos foram acessados na íntegra. Disponível em: https://www.state.gov/leaders-summit-on-climate/day-1/

Foto: Adam-Schultz/White House / Reprodução Oeco